sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Cuidado ao mexer!

O velho ditado diz que em time que está ganhando não se mexe. Mas até onde o ditado está certo? Tome como exemplo uma temporada da NBA: das 30 franquias participantes, cerca da metade acabam com recorde positivo – ou seja, estão “ganhando”. Olhando mais além: após 40 jogos, quatro times têm menos de dez derrotas (Lakers, Cavaliers, Magic e Celtics). No entanto, apenas um será campeão. E este campeão pode muito bem ser outra equipe.

A verdade é que todos pensam em melhorar, por melhor que já sejam. O problema é quando esta possível melhoria envolve trocas. Ser campeão é uma junção de fatores que vai além do talento dos jogadores. Entre eles, destaca-se a tal da química. Basquete é um esporte coletivo e produto de um esforço de grupo. Desta forma, as vitórias são reflexos de um grupo funcional: entrosado dentro e fora de quadra. Nem sempre a questão a ser considerada é, unicamente, o talento ou qualidade dos jogadores (como provou, nos últimos anos, o Knicks).

Em times fracos, trocas são necessidades, pois a dinâmica (por vários motivos) não está dando certo. Já para os fortes, que fazem ótima temporada, podem representar um grande risco. Por mais que exista melhoria técnica envolvida, é mexer com as peças de uma máquina que está operando em pleno vapor. É mexer com a química. Na última terça-feira (13), o gerente-geral do Orlando Magic (terceiro melhor time da temporada), Otis Smith, resumiu o que digo:

Você está sempre examinando seu time e procurando formas de se tornar melhor. Mas você também tem que reconhecer sua química. E, neste momento, nós temos uma química muito boa. Estamos melhorando a cada dia, nossa confiança cresce dia a dia. Se você começa a mexer com isso, essa química, é muito possível que atrapalhe as coisas.

Por que estou falando isso? As duas equipes de melhor campanha da Liga, o Lakers e o Cavaliers, passam por dilemas envolvendo a possibilidade de trocas. Os times possuem dois dos mais valiosos contratos expirantes desta temporada: Wally Szczerbiak (U$13 milhões) e Lamar Odom (U$11.4 milhões). Rumores e supostas ofertas com o envolvimento de ambos são ventiladas todos os dias.

Os fãs esperam ansiosos que mais qualidade seja adicionada à fórmula, pensando em superar todos. Afinal, ninguém quer perder boas oportunidades, “morrer” com um contrato potencial de negócios nas mãos. Mas é preciso entender que não falamos de uma ciência exata. Na teoria, o upgrade é inegável. O problema é que não se entra em quadra com a teoria. Até mesmo a melhor das intenções pode se mostrar um fiasco, na prática. E esta chance é maior quando se trata de um time de alto rendimento, onde o padrão é altíssimo.

Um exemplo atual é o Philadelphia 76ers. Na temporada passada, a equipe mostrou um ótimo entrosamento e entendimento dentro de quadra, chegando aos playoffs. Na off-season, foi muito elogiada ao conseguir trazer o ala-pivô Elton Brand – que além do melhor agente livre disponível, era o scorer de garrafão que muitos apontavam como a grande lacuna do time. Eu mesmo elogiei a contratação do jogador, considerei “perfeita”. Começou a temporada e tudo deu errado para o Sixers. Mesmo com o grande reforço, com as características necessárias, o rendimento caiu muito.

Neste momento, Philadelphia passa pela melhor seqüência positiva de sua temporada: cinco vitórias. Por coincidência (?), Elton Brand está machucado e não joga. O time base do Sixers que está atuando é o mesmo da temporada anterior. A contratação, sem dúvida, foi perfeita, mas não funcionou na prática. O terno foi feito sob medida, mas, quando vestido, não teve o caimento ideal.

Entre Cavs e Lakers, a maior chance de troca está em Cleveland. O contrato de Wally Szczerbiak é mais atrativo do que o de Odom por uma série de motivos. Primeiramente, porque é mais caro – assim, proporciona maior alívio salarial ao time, quando expirar. E, neste momento, folga no CAP é o que a maioria quer, seja pela off-season de 2010 (e o sonho de ter LeBron, Wade, Bosh, Amare...), seja por causa da crise financeira mundial e a diminuição de gastos.

Em segundo plano, Szczerbiak é mais atrativo por causa das perspectivas de renovação. Em seu próximo compromisso, Wally deverá ter queda abissal no seu salário. Hoje, algo em torno de três milhões por ano já estaria de bom tamanho para o ala-armador. Por outro lado, Odom ainda está em plenitude técnica e física, exigindo investimento muito maior por parte dos interessados em contratá-lo. Ainda existe um terceiro fator: Odom é muito mais importante para a rotação do Lakers do que Szczerbiak é para o Cavaliers.

No entanto, o Cavs também tem um motivo extra para manter Szczerbiak: a questão financeira. Hoje, a equipe de Cleveland possui a terceira folha salarial mais cara da Liga, com mais de U$90 milhões em vencimentos. Nos bastidores, dirigentes de várias franquias já falam em economizar, por causa da crise. Com uma folha tão inchada, é possível (até provável) que a franquia busque reduzir gastos – e Wally é uma alternativa bastante óbvia.

Então, antes de disparar a metralhadora contra os dirigentes inertes, é preciso entender que se trata de uma decisão complicada e envolve muito mais do que a melhoria técnica. Nem tudo o que parece certo, dá certo. A perfeição não existe. Por outro lado, os riscos são bem reais. As equipes se estruturam por anos para chegar nesta situação, em que não precisam fazer qualquer coisa para vencer. Então, torcedores das duas franquias, não esperem loucuras. Até porque as duas equipes não precisam disso. Se não forem favoritas como estão, quem é?


Na última sexta-feira (09), o Portland Trail Blazers emitiu um comunicado para as outras 29 franquias da Liga, ameaçando as equipes interessadas em contratar o ala Darius Miles apenas com o intuito de prejudicar o time do Oregon. Naquele momento, se o jogador participasse de mais duas partidas profissionais, o Blazers teria novamente debitado em sua folha salarial o contrato de Miles (U$18 milhões, por duas temporadas).

A postura foi desastrosa e causou reações. A NBA emitiu uma resposta aos 30 times dizendo apoiar qualquer equipe que quisesse contar com os serviços de Miles. Nos bastidores, entre os demais executivos da Liga, o comunicado virou motivo de indignação e piada. A associação dos jogadores ainda acusou o Blazers de colocar obstáculos à prática profissional do ala. Se tudo isso não bastasse, o Memphis Grizzlies ignorou o comunicado e recontratou Darius Miles.

Não restam dúvidas de que a postura fora de quadra do Blazers foi deplorável – e vai além do comunicado, uma vez que muitos dirigentes e jornalistas afirmam que, nos últimos meses, a franquia fez uma campanha de difamação contra o jogador. Aquilo que nem todos imaginavam era que o julgamento do time estava tão errado. Nos últimos dias, Miles esteve em quadra e mostrou perfeitas condições físicas e técnicas para continuar a carreira.

Antes de ser dispensado, o ala atuou sete minutos contra o Timberwolves. Foi pouco tempo, mas muito produtivo. O jogador fez um trabalho de marcação eficiente sobre o ala-pivô Al Jefferson, bloqueando dois de seus arremessos. Apesar de não ter pontuado, a impressão foi bastante positiva. Nesta terça-feira (13), o atleta voltou a surpreender. Em pouco menos de 14 minutos jogados, marcou 13 pontos, acertando quatro de seis tiros de quadra.

Diante dos bons rendimentos de Miles, o analista da TNT, David Aldridge, buscou dirigentes do Boston Celtics para saber mais sobre a avaliação física que a franquia fez do jogador, na off-season. O representante da equipe foi contundente ao dizer que Miles estava pronto para jogar e só não ficou em Boston por causa do fator financeiro: seu contrato custava duas vezes mais do que o do novato Bill Walker. Fisicamente, não havia qualquer problema com o ala, o que levou o time a questionar o diagnóstico do médico independente apresentado pelo Blazers.

Alguns dizem que o Blazers não deve ser penalizado, uma vez que o diagnóstico foi feito por um médico independente e a decisão de retirar ou não o contrato da folha salarial foi da NBA. Após pensar um pouco sobre a questão, sou obrigado a discordar. Quem solicitou uma avaliação independente foi a franquia, não a Liga, e ninguém garante que o médico não vai se equivocar. Portland assumiu um risco. A falha pode não ser sua culpa, mas é sua responsabilidade.

O Blazers também agiu de forma extremamente precipitada, ao confiar na opinião de que um atleta de 27 anos estava com a carreira encerrada. Atualmente, isso é muito raro. A situação torna-se ainda mais precipitada ao atestar que jogadores de destaque na Liga, como Amare Stoudemire, se recuperaram de problema físico da mesma natureza do sofrido por Miles. Não importa se o médico é independente, a franquia poderia ter consultado uma junta médica particular para atestar o laudo oficial.

Só para constar: em que mundo distorcido um médico declara o fim da carreira profissional de um atleta e, nove meses depois, este mesmo atleta aparece em condições físicas plenas de competição?

Agora, o Blazers ameaça processar o Memphis Grizzlies. David Aldridge procurou um advogado especializado em questões esportivas, envolvido com a NBA, para uma opinião técnica judicial. Ele diz que o problema não será encontrar uma forma de processar (esta é a parte fácil), mas vencer o processo – ainda mais quando os pouquíssimos argumentos que se tem são (e continuarão sendo) rebatidos pelas boas atuações de um atleta visivelmente capaz de entrar em quadra e jogar em nível profissional.